Texto de conclusão de disciplina "Tópicos de
Antropologia Filosófica" de Eneide Pompiani de Moura. Tema: “Antropologia segundo: Platão, Santo Agostinho, Idade Média, Idade da Renascença e Idade Contemporânea”. Curso de Pós-graduação em Filosofia da
Existência,Universidade Católica de Brasília - Polo: São Paulo - coordenado pelo Prof Vicente Sergio Brasil Fernandes
(abril/2012).
NOTA FINAL: 97,0
NOTA FINAL: 97,0
Local: Morada do Silencio - Curitiba - Estado do Paraná - Brasil
O papel do diálogo como aspecto fundamental na significação
do homem platônico, parte do paradigma que para Platão o homem é um ser
concreto, inquieto na busca a auto-compreensão através de sua autonomia no
direcionamento de seu discurso.
Para
Platão é pela palavra partilhada no processo de diálogo que o ser humano cria o
mundo, a verdade e simultaneamente vai se reconhecendo através da
auto-expressão não sistematizada. Verdades partilhadas constroem consensos
dialógicos onde há uma compreensão de si mesmo e do outro. Esse modo de ser do
homem no mundo que necessita se abrir para o outro, com uma forma respeitosa e
reconhecedora do diálogo, cria a possibilidade de fazer nascer a verdade que,
no fundo, já habitava em cada um dos interlocutores. Essa necessidade de
comunicação no diálogo identificada por Platão valoriza o agir em direção ao
outro na polis representada pela vida social mais universal,
possibilitando a novas posturas além da dimensão familiar.
Assim, é em Platão que se tem no diálogo a condução plena da existência
humana através da auto-expressão do ser humano (expressão do ser de sua
existência), de não se entregar ou não se integrar a nenhuma forma de
esquematização analítica, de ultrapassar os limites das palavras, que pressupõe
a existência concreta de um Ser que fala (Ser como intersubjetividade), que
especula com o outro através da troca de conhecimentos e respeito com o outro.
Assim, há duas dimensões nos Diálogos de Platão, uma ligada a ação e
outra com a política, quando informa a necessidade da comunicação (diálogo) que
é agir sobre e em direção ao outro como, também, indica o viver em sociedade
(política).
Platão, ao distinguir o
homem filósofo como aquele que vive segundo o espírito e o não filosófico
aquele que vive segundo a visão sensível das coisas, faz com que a alma adquira
uma importância singular, em detrimento do corpo, considerado com entrave para
a existência. Mas, em minha opinião, esta problemática é uma relação dinâmica
que só terá existência se for vivida. Portanto, a dualidade alma-corpo é algo
fundamental para a compreensão mais abrangente da existência.
Já as
características fundamentais do homem greco-romano estão presentes na
fundamentação agostiniana.
Explicando
melhor, é no período greco-romano as reflexões filosóficas centram-se no homem,
partindo de suas experiências através do seu histórico-pessoal. É valorizado aquilo
que possui importância pessoal e que, para poder ser valorizado, precisa que
ele veja sua vida a partir de si mesmo, tentando definir sua condição como
pessoa. Este referencial está presente em Santo Agostinho que tem como ponto de
partida a concepção de homem a partir de sua própria experiência interior. Em
sua obra “Confissões” ele afirma: “Eis que habitavas dentro de mim e eu lá fora
a procurar-Te”.
Assim,
a filosofia passa a ser vista como o desenrolar da própria vida do homem. É
preciso que a fundamentação filosófica tenha em vista essa vida, perseguindo
incessantemente os seus fins. Agostinho se baseia na
certeza de que a vida está sempre presente para nós mesmos. Somos nós que a
definimos e construímos.
A filosofia greco-romana e agostiniana tem como objetivo comum
compreender a própria vida, valorizando e dando conta, a partir da linguagem,
da vida do homem tal como ela é e acontece. Carrega assim, a tarefa do homem
compreender a totalidade de sua vida, construindo os significados conscientes
de sua existência.
A tomada de “decisão
agostiniana” pode significar uma antecipação das problemáticas existenciais
fundadas na contemporaneidade tendo como características fundamentais da
antropologia agostiniana: o homem como um ser uno; o homem como um ser
itinerante; o homem como um ser-para-Deus.
A
antropologia agostiniana especifica que o homem quando não está contente
consigo mesmo, ele busca um novo “eu”, isto pode
ser observado com a decisão histórica do próprio Agostinho quando num primeiro
momento ele é um famoso professor de oratória a procura de fama e num segundo
momento quando é acometido por uma doença e por isso, decide interromper a sua
carreira e objetivo para tomar uma outra decisão histórica que neste caso foi
abraçar o cristianismo. O mais importante nesta decisão (2.o momento) é o seu
domínio de uma história interior da vida (1.o momento) para um desvio de sua
função vital como forma de reação interior frente aos novos fatos de sua vida –
doença – escolhendo o 2.o momento como sua decisão histórica buscando um novo
eu. Agostinho não nega a nova situação da fragilidade de sua saúde ao contrário
por meio de sua vontade voluntária ele busca uma outra convicção de verdade
para o seu projeto de vida, re-elaborando em sua essência a sua pessoa
espiritual como forma motivadora para o seu novo projeto de vida interior
despertando uma nova motivação psicológica. A crença na realidade de Agostinho
acentua que a unidade da vida somos nós que a formamos e que nós estamos sempre
presentes para nós mesmos.
A ampliação dos horizontes
da visão de mundo da humanidade, vem de encontro no período da Renascença dos
descobrimentos geográficos e com ele toda uma cultura, para não dizer da
revolução de Copérnico.
A consciência do homem
sobre si mesmo a partir de sua autonomia, a liberdade, a individualidade marca
o ideal do homem através da vida subjetiva, natural rompendo com todo elemento
supra-sensível e sem o caráter religioso. Assim, há a percepção e da ação do
homem como centro de todas as coisas, objetivando o domínio sobre a natureza.
Neste momento, o homem da
Renascença se opõe aos valores da Idade Média, mas opera uma continuidade com
os valores e estruturas medievais. Por isso, o conceito de homem na Renascença é
dinâmico. Assim, o homem renascentista surge como consequência da decadência do
homem medieval. Inaugura-se uma nova relação individual com a sociedade, a
questão da escolha de seu próprio destino por cada um trouxe novos valores e um
modo de comportamento acentuadamente individualista. Com o renascimento dissolve-se
o sistema medieval unitário de valores, dando lugar ao sistema pluralista de
valores morais.
No renascimento o homem tem
consciência de si a partir de sua autonomia, independente de qualquer norma que
transcenda a sua natureza. A liberdade e a individualidade passam a ter um
valor de mundo e do próprio homem. O ideal do homem é de vida subjetiva,
natural, individual, rompendo com todo elemento supra-humano, sem caráter
religioso.
O Renascimento é a continuação dos
pensamentos da Idade Média como reestrutura de valores e estruturas. Por isso,
o renascimento apresenta as inquietudes apresentadas na idade média, mais sob
uma forma dinâmica dos conceitos do homem, quando a pessoa passa a ter a sua
própria história de desenvolvimento pessoal e assim a sociedade também adquire
sua história de desenvolvimento. O homem no renascimento procura a unidade
entre conceitos de homem e ideal de homem (ideais pluralistas/ valores morais
pluralistas) oposto aos valores do sistema medieval unitário de valores.
No final da Idade Média o sentimento
entre as pessoas, submetidas a este sistema coletivo, era de depressão,
melancolia e ansiedade desenvolvendo como resultado deste estado de
descontentamento a busca pelo individualismo como reação ao coletivismo
deteriorado.
No Renascimento o individualismo
encontra apoio nas ciências modernas através do domínio da natureza. Esse
domínio significa o poder de dispor da natureza segundo as necessidades e
conveniência do homem (como observado por Descartes em sua obra 1637 – Discurso
do Método, Francis Bacon – utilitarismo, matemática – fenômenos mensuráveis
reais).
A
dimensão de historicidade implica ou afeta o modo de ser do homem contemporâneo
quando passa a ser vislumbrada na possibilidade de uma autoconsciência da
história.
A
Historicidade no homem contemporâneo parte do paradigma que o homem não é
somente produto de sua história, mais possuidor de autoconsciência de sua
história, tendo uma capacidade de escolha e independência para um
desenvolvimento pessoa e histórico auto-consciente (o homem tem domínio de seu
próprio destino histórico).
Isto
significa que o homem tem a capacidade de moldar a sua história nas direções
por ele escolhidas. Dá-se ao homem a possibilidade de vivenciar novos valores
com objetivo de expansão do indivíduo refletindo diretamente em sua cultura que
passa a se efetivar sempre de forma renovada. Como resultado a historicidade
deve comportar o exercício de liberdade como dimensão autêntica e específica do
homem.
No
conceito de historicidade a historia não é mais um fato consumado mais um
passado não acabado nem terminado onde se alarga com as novas compreensões, com
o resgate de novos sentidos sobre o homem e sua história. A ênfase está na
parte ativa do homem, à criação atual e futura da historia e da sua história.
A historicidade além de ser um
desdobramento é também como cristalização de todos os elementos fundamentais da
existência. Uma das características essenciais do homem é a de ser ele
histórico e isto pelo fato principalmente de ser capaz de realizar sua própria
existência.
Quando o homem se torna consciente ou
autoconsciente, ele se institui como sujeito. Ser sujeito é voltar a centrar-se
em si próprio através de sua percepção consciente dando-lhe um sentido de
liberdade.
A
intersubjetividade, situação na qual vários sujeitos formam uma sociedade ou
comunidade dá importância o reconhecimento do outro
além do próprio pensamento como também do corpo (ou corporeidade) em suas
varias expressões e significações. O Eu e o Outro são sujeitos numa visão subjetiva.
É pelo comportamento que o eu torna-se acessível ao outro e é pelo
comportamento do outro que este se torna acessível ao eu.
A
liberdade ao ser exercida a partir de situações concretas vem da ação com
responsabilidade. Quando a liberdade assume um sentido de maturidade, o homem
realiza os seus atos sem a necessidade da aprovação ou reprovação dos outros
assumindo um status de autenticidade, por não estar preocupado com nenhum tipo
de legitimação para sua existência a não ser ela própria.
Ao
ser conseguido o status de liberdade com maturidade pressupõe-se a libertação
de vários estados de alienação como: sujeição social, política, econômica,
ideológica, medo e relações imaturas com vários âmbitos da existência.
A
liberdade madura significa que o homem possui a si mesmo e é ele quem determina
as diretrizes de sua existência, sem qualquer interferência negativa de
dimensões externas, mas a partir de opções bem refletidas e essencialmente
pessoais.
Autora: Eneide Pompiani de Moura
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